A história é implacável. Por mais que estejamos vivendo no país que mais mata transexuais e travestis no mundo, nunca antes tantas mulheres trans foram eleitas no Brasil como no último pleito. Segundo a Antra, são pelo menos 13 em municípios de todas as regiões do país. Uma vitória e tanto, não só para as trans, mas também para todo mundo que acredita em diversidade e em respeito à identidade de gênero e à orientação sexual de cada um.

E pensar que faz apenas 18 meses que a sra. Damares Alves gritava empolgada, ao assumir a pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, “agora é assim: menina veste rosa e menino veste azul”.

Algumas pessoas chegaram a questionar se a frase simplesmente normalizava uma situação que não tinha nada com aquele “agora” da ministra. Colocando em contexto, e usando um levantamento da ONG Transgender Europe, 868 pessoas trans foram assassinadas no Brasil entre 2006 e 2019.

Mas talvez, e infelizmente, ela normalizou sim, de certo modo, pois, entre janeiro e agosto de 2020, 129 pessoas trans foram assassinadas no Brasil, segundo dados da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais).

O fato é que nosso país é considerado o pior lugar do mundo para ser trans. E, para essas pessoas que, ao contrário do que os preconceituosos pensam, não escolheram ser assim, a sensação de pavor tem aumentado com as declarações das autoridades, Bolsonaro à frente. Na semana passada, o presidente disse, em um discurso exaltado, que o Brasil “não podia ser um país de maricas”.

Em meio a essa realidade apavorante, eis que ganhamos um respiro, uma aparente resposta a tanto ódio. E ela veio das urnas.

Foram 13 trans eleitos: mais do que o dobro em relação às eleições de 2014, quando 6 trans tornaram-se vereadores. Além disso, de acordo com os números da Antra, o número de vereadores trans mais que dobrou. Nas últimas eleições municipais, o número de trans eleitos foi de 6. Esse ano, 281 candidatos se identificaram como trans, ainda segundo a associação.

E esse boom de candidaturas trans teve outras consequências. Em São Paulo, por exemplo, foram eleitos, pela primeira vez, um homem e uma mulher trans na mesma eleição, Erika Hilton, do PSOL, e Thammy Miranda, do PL – e eles ficaram entre os dez mais votados. Em Belo Horizonte, Duda Salabert, do PDT, teve 37.613 votos, tornando-se a candidata mais bem votada da história na capital mineira e a mais votada deste ano.

Em Aracaju, Linda Brasil, do PSOL, também foi a mais votada entre todos os candidatos.

Isso significa que o Brasil mudou? Não, mas aponta para o fato de que pode mudar, tornando-se mais inclusivo e menos discriminatório, mais compassivo e menos violento. Estamos nessa luta. E você?